Jaime Mayaki, OMT: O turismo não pode continuar a ser pensado como antes
O sistema de all inclusive que tem sido o grande motor do turismo em Cabo Verde não é sustentável e o sector deve seguir novos rumos. De qualquer modo, avalia o vice-director do Programa Regional para África, da Organização Mundial de Turismo (OMT), o país está já na direcção certa e isso denota-se na vontade política e planeamento assumidos para o futuro do sector.
O modelo dos resorts trouxe receitas para Cabo Verde, e terá contribuído até para que este ascendesse a país de rendimento médio. É um facto, aponta Jaime Mayaki. Porém, considera o especialista, este sistema – “uma experiência pela qual Cabo Verde passou”, não pode continuar a ser o caminho.
Aliás, em consonância com as tendências mundiais, e como salienta, “2017 foi declarado pelas Nações Unidas como o ano internacional do turismo sustentável para o desenvolvimento, por forma a chamar a atenção a todos os estados, stakeholders, hotéis, etc., de que, de agora em diante, a sustentabilidade tem de ser aplicada à forma como fazem negócio”.
Ou seja, “o negócio não pode ser feito da forma como era feito antes”, resume Jaime Mayaki, que falava aos jornalistas à margem do IV Fórum Mundial de Desenvolvimento Económico Local, no qual foi orador no painel interactivo “Turismo e Desenvolvimento Local nos PEIDs”.
Porém, pelo que pôde observar, Cabo Verde já interiorizou essa mudança, pretendendo neste momento apostar num turismo que beneficie a população local e seja desenvolvido de modo sustentável. O representante da OMT, aponta, elogiando o país, que essa noção está, na realidade, bem plasmada na agenda nacional de desenvolvimento. De acordo com uma análise que realizou aos planos dos seis PEIDs africanos (Cabo Verde, São Tomé e Príncipe, Guiné-Bissau, Seychelles, Maurícias e Comores) apenas no de Cabo Verde o turismo é abordado tendo em conta: objectivos, políticas para o sector e um plano de implementação detalhado dessas políticas. “Apenas Cabo Verde contempla estes três critérios”, sublinha.
O próprio facto do sector estar inserido num ministério que contempla a Economia e o Emprego, é para o especialista, positivo pois permite “uma visão e abordagem holística de como o sector deve ser tido em conta”.
Assim, ressalta: “há um pensamento e planeamento detalhados e penso que Cabo Verde está na direcção certa. Obviamente vai levar algum tempo, mas a vontade política existe, isto é o mais importante. O efeito bola de neve estará lá”.
Jaime Mayaki adverte porém que é “essencial” envolver as comunidades em todo o processo de tomadas de decisão e implementação das políticas do turismo, consultando-as, engajando-as e empoderando-as. E é necessário, não só assegurar que existem “benefícios equitativos do turismo dentro das comunidades” como “promover interacções benéficas entre as comunidades e os turistas”. Isto, até por forma a evitar a turismofobia (rejeição e atitudes violentas contra turistas) como já se tem vindo a verificar noutros pontos do mundo, nomeadamente na Europa.
Isenção de vistos é positiva
O vice-director do Programa Regional para África saudou também a já manifestada vontade do governo de isentar os turistas europeus e britânicos, de vistos.
“O ‘visa free’ é uma oportunidade para qualquer país”, disse, acrescentando que tanto do seu ponto de vista pessoal como no da OMT, limitar o movimento das pessoas é negativo não só de um ponto de vista social e humano, como económico.
Na realidade, tudo o que contribua para facilitar a mobilidade – incluindo o visto electrónico – deve ser visto como um activo.
Por isso, e salvaguardando que a muito criticada questão da reciprocidade deve ser discutida a um nível político, do ponto de vista do turismo esta é uma “boa medida”, considera.
Promover o turismo intra-regional
Entretanto, falando a um nível mais abrangente, Jaime Mayaki sublinhou a importância de promover o turismo intra-regional. Para tal, há que ultrapassar diversos desafios, nomeadamente o da conectividade e da facilitação de vistos entre países africanos de blocos diferentes.
A Segurança é outro dos destaques. Basta ver, como observa Jaime Mayaki, que grande parte dos ataques terroristas que África sofreu em anos recentes, tiveram como alvo infra-estruturas turísticas e turistas. “Tunísia, Cote d’Ivoire, Mali, Burkina Faso… Foram eventos que afectaram o sector turístico. A Tunísia só agora está a recuperar e os últimos anos foram muito difíceis para eles,” lamentou.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 830 de 25 de Outubro de 2017.
Fonte: Expresso das Ilhas